terça-feira, 13 de novembro de 2007

Arrabal presenteia-nos, divulgando nossa peça para o mundo!

A juventude Ilustrada

É com grande orgulho que anuncio um inesquecível presente do querídissimo dramaturgo espanhol Fernando Arrabal: "Sin tiempo ni de estornudar le envio un cariñoso recuerdo" (Sem tempo nem para espirrar, envio-lhe uma carinhosa lembrança") :

http://newperformancestheatre.blogspot.com/2007/11/juventud-ilustrada-so-paulo-brasil.html

O dramaturgo publicou, em seu blog pessoal, a divulgação sobre nossa montagem da peça "A juventude ilustrada"!



Arrabal presenteia-nos, divulgando nossa peça para o mundo!

A juventude Ilustrada

É com grande orgulho que anuncio um inesquecível presente do querídissimo dramaturgo espanhol Fernando Arrabal: "Sin tiempo ni de estornudar le envio un cariñoso recuerdo" (Sem tempo nem para espirrar, envio-lhe uma carinhosa lembrança") :

http://newperformancestheatre.blogspot.com/2007/11/juventud-ilustrada-so-paulo-brasil.html

O dramaturgo publicou, em seu blog pessoal, a divulgação sobre nossa montagem da peça "A juventude ilustrada"!



quarta-feira, 7 de novembro de 2007

Aos alunos-atores interessados,

Estamos agendando uma primeira reunião, junto aos interessados em conhecer as propostas de curso (teóricos, práticos e preparatórios para EAD) e realizar suas inscrições, para o dia 21/11 (quarta-feira, após o feriado), nas mesinhas do Centro Cultural São Paulo (estação Vergueiro do metrô), ao lado da biblioteca. Interessados deverão enviar nome completo e telefone para o email: teatroindependente@gmail.com , para que seus nomes sejam adicionados à lista. O encontro acontecerá às 20:00hs.
Contamos com a presença de todos!
Evoé!

terça-feira, 6 de novembro de 2007

Oportunidades

O Teatro Independente abriu vagas para alunos-atores que tenham interesse em cursos teóricos e práticos. Serão oferecidos diversos cursos, sobre os mais diversos temas e autores. Os alunos também poderão optar pelas aulas práticas, que encerram com a apresentação de um espetáculo.
O grupo oferece cursos livres e de formação contínua de atores, sendo que este último é voltado àqueles que desejam obter DRT.
Será oferecido, também, um curso preparatório para atores que tenham interesse em prestar a prova da EAD (Escola de Artes Dramáticas - USP). Este curso já foi ministrado anteriormente, com grande sucesso, com diversos alunos aprovados.
O grupo conta com um vasto acervo de raríssimos materiais bibliográficos e audiovisuais, para enriquecer a formação de seus atores.

Todos os interessados deverão enviar um email, com urgência, para obter mais informações ao:
teatroindependente@gmail.com

Contamos com a participação de todos!

segunda-feira, 13 de agosto de 2007

--- Blog em fase de reestruturação --- Voltem para conferir o novo visual do nosso blog em alguns poucos dias!! ---

quarta-feira, 13 de junho de 2007

A oração, de Fernando Arrabal

Queridíssimos integrantes do Teatro Independente, como nosso foco de trabalho, em uma das montagens, repousa sobre Arrabal, envio, a seguir, para enriquecer-nos de material, a peça "A oração".

A Oração

Escuridão.
Fracos gritos de um recém-nascido durante um momento.
De repente, um grito forte do bebê, seguido imediatamente de um silêncio.


Fídio: A partir de hoje, nós seremos bons e puros.
Lilibé: O que lhe aconteceu?
Fídio: Eu disse que a partir de hoje nós seremos bons e puros, como os anjos
Lilibé: Nós?
Fídio: Sim
Lilibé: Não conseguiremos.
Fídio: Você tem razão, será muito difícil. Mas vamos tentar
Lilibé: Como?
Fídio: Observando a lei do Senhor.
Lilibé: Eu não me lembro dela.
Fídio: Eu também não.
Lilibé: Então como é que vamos fazer?
Fídio: Para saber o que é o bem e o que é o mal?
Lilibé: Sim.
Fídio: Eu comprei a bíblia.
Lilibé: E isso basta?
Fídio: Sim. Basta.
Lilibé: Nós seremos santos.
Fídio: Isso é pedir demais. Em todo caso tentaremos.
Lilibé: Ah, então vai ser muito diferente?
Fídio: Sim, muito
Lilibé: Não vamos mais nos aborrecer como agora?
Fídio: E além do mais será muito bonito.
Lilibé: Você tem certeza?
Fídio: Acho que sim.
Lilibé: Leia um pouco pra mim.
Fídio: Da bíblia?
Lilibé: Sim.
Fídio: (ENTUSIASMADO) – “No princípio Deus criou o céu e a terra.” Como é bonito!
Lilibé: Sim, é muito bonito.
Fídio: (LENDO) “Deus disse: faça-se a luz, e a luz se fez”. “Deus viu que a luz era boa e separou a luz das trevas. Deus chamou a luz do dia, e as trevas de noite. Assim foi feito o dia e a noite, surgindo o primeiro dia.”
Lilibé: Tudo começou assim?
Fídio: Tudo. Vê como é simples?
Lilibé: Nossa! Tinham me explicado de um jeito bem mais complicado.
Fídio: As histórias do universo?
Lilibé: É.
Fídio: A mim também.
Lilibé: E também a evolução.
Fídio: Que coisa estranha! (PAUSA)
Lilibé: Leia um pouco mais
Fídio: “E o Deus eterno fez o homem da poeira da terra, e dando-lhe um sopro, o Deus eterno fez a mulher da costela que tirou do homem”. (FÍDIO E LILIBÉ SE BEIJAM)
Lilibé: (INQUIETA) – E nós vamos poder dormir juntos?
Fídio: Não.
Lilibé: Mas eu vou sentir frio.
Fídio: Você se acostuma.
Lilibé: E você? Não vai sentir frio?
Fídio: Vou. Claro.
Lilibé: Mas pelo menos não vamos brigar pelas cobertas.
Fídio: Não. Claro.
Lilibé: Tá aí um negócio difícil, a bondade.
Fídio: É, muito.
Lilibé: Eu vou poder mentir?
Fídio: Não.
Lilibé: Nem mesmo umas mentirinhas?
Fídio: Nem isso.
Lilibé: E roubar laranjas?
Fídio: Também não.
Lilibé: Nem brincar como antes no cemitério?
Fídio: Sim. Por que não?
Lilibé: E furar os olhos dos mortos, como antes?
Fídio: Ah, isso não.
Lilibé: E matar?
Fídio: Não.
Lilibé: Então vamos deixar que as pessoas continuem vivendo?
Fídio: Vamos.
Lilibé: Pior pra elas.
Fídio: Você não percebeu o que é preciso fazer para ser bom?
Lilibé: Não.(PAUSA) e você?
Fídio: Não muito bem. (PAUSA) – Mas eu tenho o livro e com ele saberei.
Lilibé: Sempre o livro.
Fídio: Sempre.
Lilibé: E o que acontecerá depois?
Fídio: Iremos pro céu.
Lilibé: Os dois?
Fídio: Se tivermos um bom comportamento, sim.
Lilibé: E o que faremos no céu?
Fídio: Brincaremos.
Lilibé: Sempre?
Fídio: Sempre.
Lilibé: Não é possível! (INCRÉDULA)
Fídio: Claro que é.
Lilibé: Por quê?
Fídio: Por que Deus é todo poderoso. Deus faz coisas impossíveis: Milagres.
Lilibé: (ADMIRADA) Puxa!
Fídio: E de um jeito bem simples.
Lilibé: Eu no lugar dele faria a mesma coisa.
Fídio: Ouça o que diz a bíblia: “Foi levado um cego até Jesus, e pediram que o tocasse,, ele pegou o cego pela mão e o levou pra fora da aldeia, depois ele colocou saliva sobre os olhos, colocou as mãos e lhe perguntou se via algo. Ele olhou e disse que via os homens como árvores que andam. Jesus colocou de novo, a mão sobre os olhos, e quando o cego olhou fixamente, estava curado e viu tudo claramente.”
Lilibé: Como é lindo!
Fídio: Ele dizia que é preciso ser bom.
Lilibé: Então nós seremos bons.
Fídio: Temos que ser como as crianças.
Lilibé: Como as crianças?
Fídio: Sim. Puros como as crianças.
Lilibé: É difícil.
Fídio: Tentaremos.
Lilibé: Por que você pegou essa mania agora?
Fídio: Porque eu estava de saco cheio.
Lilibé: Só por isso?
Fídio: E além disso, foi tão sem graça o que fizemos até agora.
Lilibé: E que história é essa de céu?
Fídio: É pra onde iremos depois da morte.
Lilibé: Vai demorar tanto assim?
Fídio: É. Vai.
Lilibé: Não podemos ir um pouco antes?
Fídio: Não.
Lilibé: Assim não tem graça.
Fídio: Sim. É muito chato.
Lilibé: O que faremos no céu?
Fídio: Vamos brincar, oras!
Lilibé: Ah, me parece tão impossível! Eu gostaria que você dissesse isso outra vez.
Fídio: Nós seremos como os anjos.
Lilibé: Como os bons ou como os outros?
Fídio: Os outros não vão para o céu. Os outros são demônios e vão para o inferno.
Lilibé: E o que eles fazem lá?
Fídio: Eles sofrem muito. Ardem. Queimam.
Lilibé: Que diferente!
Fídio: Esses anjos eram muito maus e se revoltaram contra Deus.
Lilibé: Por quê?
Fídio: Por orgulho. Eles queriam ser mais que Deus.
Lilibé: Passaram dos limites.
Fídio: Demais.
Lilibé: Nós não chegamos a tanto.
Fídio: Realmente, não chegamos.
Lilibé: Olha, eu quero começar a ser boa agora.
Fídio: Comecemos imediatamente.
Lilibé: Mas assim? Sem nenhuma transição?
Fídio: É.
Lilibé: Ninguém vai perceber.
Fídio: Deus vai perceber.
Lilibé: Certeza?
Fídio: Sim. Deus vê tudo.
Lilibé: Ele vê até quando eu faço xixi?
Fídio: Também.
Lilibé: Agora eu vou começar a ter vergonha.
Fídio: Deus marca com letras de ouro, num livro lindo, tudo o que você faz de bom. E num livro muito vil, com uma letra muito feia, todos os seus pecados.
Lilibé: Eu serei boa. Eu quero que ele escreva sempre com letras de ouro.
Fídio: Você não deve ser boa só por isso.
Lilibé: E por que mais então?
Fídio: Pela sua felicidade.
Lilibé: Que felicidade?
Fídio: Para ser feliz.
Lilibé: Eu poderia ser feliz sendo boa?
Fídio: Claro.
Lilibé: Será que felicidade existe?
Fídio: Existe. (PAUSA) – É o que dizem.
Lilibé: E o que nós fizemos antes?
Fídio: O que nós fizemos de mau?
Lilibé: É.
Fídio: Precisamos confessar.
Lilibé: Tudo?
Fídio: É. Tudo.
Lilibé: E também que você me despe para que os seua amigos durmam comigo?
Fídio: Inclusive.
Lilibé: E tembém que matamos? (APONTA O CAIXÃO MORTUÁRIO)
Fídio: É. Também. (PAUSA TRISTE) – Não devíamos tê-lo matado. (PAUSA) – Somos maus. É preciso ser bom.
Lilibé: (TRISTE) – Nós o matamos pelo mesmo motivo.
Fídio: O mesmo motivo?
Lilibé: É matamos para nos divertir.
Fídio: É verdade.
Lilibé: E a gente só se divertiu um pouquinho.
Fídio: É.
Lilibé: Se a gente tentar ser bom, não vai ser a mesma coisa?
Fídio: Não. É mais completo.
Lilibé: Mais completo?
Fídio: E mais bonito.
Lilibé: E mais bonito?
Fídio: Sim. Você sabe como nasceu o filho de Deus? (PAUSA) – Aconteceu há muito tempo. Ele nasceu em uma manjedoura muito pobre de Belém, e como ele não tinha dinheiro para comprar agasalho, uma vaca e um burro o aqueceram com sua respiração. E como a vaca ficou muito contente de servir a Deus, ela fazia muu, muu e o burro relinchava. E a mãe da criança, que era a mãe de Deus, chorava. E seu marido a consolava.
Lilibé: Isso me agrada muito.
Fídio: A mim também.
Lilibé: E o que aconteceu com a criança?
Fídio: Ela não tinha nada, ainda que fosse Deus. E como os homens eram maus, não lhe deram nada de comer.
Lilibé: Que gente!
Fídio: Mas um dia, num reino muito distante, reis que eram muito bons viram uma estrela que caminhava no céu e a seguiram.
Lilibé: Ah, são aqueles que põem presentes nos sapatos?
Fídio: Sim (PAUSA) – E eis que eles seguiam... seguiam... seguiam... a estrela, até que chegam um dia à manjedoura de Belém. Então eles ofereceram à criança, tudo o que traziam em seus camelos: muitos brinquedos e balas e chocolate. (PAUSA. ELES SORRIEM COM ENTUSIASMO)
Lilibé: Que coisas!
Fídio: Então a criança ficou muito contente e seus pais também, e a vaca e o burro também.
Lilibé: O que aconteceu depois?
Fídio: Depois a criança ajudou seu pai, que era carpinteiro, a fazer mesas e cadeiras. E como ele era bem comportado sua mãe o beijava sempre.
Lilibé: Uma criança bem diferente das outras.
Fídio: Ele era Deus.
Lilibé: É verdade...
Fídio: E o que era bom, é que nessa época ele não fez nenhum milagre para comprar roupas caras ou comer melhor.
Lilibé: E depois?
Fídio: Depois ele se fez homem e eles o mataram: eles o crucificaram com pregos nas mãos e nos pés. Já pensou?
Lilibé: (CONTENTE)- Deve doer muito.
Fídio: Sim. Muito.
Lilibé: E ele deve ter chorado muito.
Fídio: Não. De jeito nenhum. Ele se continha. Aliás, para humilhá-lo mais ainda eles o colocaram entre dois ladrões.
Lilibé: Ladrões. Maus ou simpáticos?
Fídio: Maus, dos piores. Os dois piores que encontraram.
Lilibé: Isto é mau.
Fídio: E não é que um dos sois não era ladrão, era um impostor. Um indivíduo que enganava todo mundo.
Lilibé: Que enganava todo mundo?
Fídio: Sim. Ele tinha feito todo mundo pensar que ele era mau e de repente descobriram que ele era bom.
Lilibé: E o que aconteceu depois?
Fídio: Bem. Deus morreu na cruz.
Lilibé: Foi?
Fídio: Sim. Mas ele ressuscitou.
Lilibé: (CONTENTE) Ah!
Fídio: E todos perceberam que ele tinha dito a verdade.
Lilibé: (ENTUSIASMADA)- Eu quero ser boa.
Fídio: Eu também.
Lilibé: Imediatamente.
Fídio: Sim. Imediatamente. (FÍDIO TOMA AS MÃOS DE LILIBÉ ENTRE AS SUAS)
Lilibé: (INQUIETA) – E como vamos passar o tempo?
Fídio: Bem. Quase o tempo todo.
Lilibé: E os outros dias?
Fídio: Iremos ao zoológico.
Lilibé: Para ver as sacanagens do macaco?
Fídio: Não (PAUSA) – Para ver as galinhas e as pombinhas.
Lilibé: E o que mais podemos fazer?
Fídio: Tocaremos ocarina.
Lilibé: Ocarina?
Fídio: Sim.
Lilibé: Bom. (PAUSA) – Não é mau?
Fídio: Não. Eu acho que não.
Lilibé: E como faremos para sermos realmente bons?
Fídio: Você vai entender. Se a gente percebe que alguma coisa incomoda alguém, você não a faz. Quando você percebe que alguma coisa dá prazer a alguém, você a faz. Se você ver um pobre velho paralítico, que não tem ninguém no mundo, aí você vai visitá-lo.
Lilibé: A gente não o mata?
Fídio: Não.
Lilibé: Coitado do velho.
Fídio: Mas você não entende que a gente não pode mais matar?
Lilibé: Continue.
Fídio: Se você vê que uma mulher carrega um fardo pesado, você a ajuda. (VOZ DE JUIZ) – Se você ver que alguém comete uma injustiça, você a repara.
Lilibé: As injustiças também?
Fídio: Também.
Lilibé: (SATISFEITA) – Vamos ser pessoas importantes.
Fídio: Sim. Muito.
Lilibé: (INQUIETA) – E como saberemos quando é uma injustiça?
Fídio: Veremos isso fazendo um julgamento. (SILÊNCIO)
Lilibé: Vai ser entediante. (SILÊNCIO) – Vai ser como todo o resto. (SILÊNCIO) – E vai ser penoso. (SILÊNCIO)
Fídio: Vamos tentar. (OUVE-SE À DISTÂNCIA “WHAT A WONDERFUL WORLD” DE ARMSTRONG)

terça-feira, 1 de maio de 2007

Leia texto teatral de Arrabal, em português.

FANDO E LIS

Enviado por: Rê Meireles

(Texto distribuído através do site www.oficinadeteatro.com)

Rápida introdução, por Wilson Coêlho - Encenador

O absurdo do mundo do dramaturgo espanhol Fernando Arrabal não nasce do desespero do filósofo em busca de penetrar o segredo da existência, mas da absurdidade dos personagens que vêem a situação humana com os olhos da simplicidade ou imediaticidade infantil, que não permite uma maior compreensão da realidade do objeto observado. Também como as crianças, seus personagens são por vezes cruéis, porque não compreenderam ou sequer tentaram compreender a existência de uma lei moral. E assim como as crianças, eles sofrem a crueldade de um mundo como flagelos incompreensíveis.
Em Fando e Lis - uma peça em 5 quadros - o personagem Fando empurra a amada Lis, que é paralítica, numa cadeira de rodas a caminho de Tar. Fando ama Lis, profundamente, mas ao mesmo tempo ela o irrita por ser-lhe uma pesada carga. Mesmo assim, procura diverti-la tocando em seu tambor a única coisa que sabe, a canção da pena.
Fando e Lis encontram três senhores que carregam um guarda-chuva e que também estão a caminho de Tar. Assim como Fando e Lis, parece quase impossível que estes senhores encontrem seu destino, pois - em vez de chegarem a Tar - ficam sempre rodando em torno do ponto de partida. Fando, muito orgulhoso, exibe a beleza de Lis aos três senhores, levantando-lhe a saia para que eles vejam-lhe as coxas e até convidando-os a beijá-la. Apesar do amor que sente por Lis, Fando não consegue resistir à tentação de ser cruel com ela.
No quarto quadro, vamos saber que, para exibi-la aos três senhores, Fando a deixou nua, ao relento, durante toda uma noite, com o que abalou a sua saúde e, depois, acorrentou-a e colocou-lhe algemas para ver se ela era capaz de arrastar-se como os outros. Fando espanca Lis até derrubá-la. Na queda, Lis quebra o seu tambor. Furioso, ele a espanca até que ela perca os sentidos e, quando retornam os três homens, a encontram morta.
A última cena nos mostra os três senhores de guarda-chuva a discutir confusamente o que aconteceu quando, de repente, Fando aparece com uma flor e um cachorro: ele havia prometido a Lis que, quando ela morresse, ele a visitaria em seu túmulo com uma flor e um cachorro. Os três senhores acompanham-no ao cemitério e, depois, os quatro vão tentar, novamente, encontrar o caminho de Tar.


Fando e Lis


Texto de Fernando Arrabal

Tradução de Wilson Coêlho



Personagens:
Lis, a mulher do carrinho
Fando, o homem que a conduz a Tar e os três homens do guarda-chuva
Namur
Mitaro
Toso


A peça tem cinco quadros.

QUADRO I

(Fando e Lis estão sentados no chão. Perto deles se encontra um grande carrinho de criança, preto, envelhecido e descascado, com rodas finas de borracha macias e raios enferrujados. Por fora do carrinho e amarrados com cordas há uma porção de objetos, entre os quais destacam um tambor, uma coberta enrolada, uma vara de pescar, uma bola de couro e uma caçarola. Lis é paralítica das duas pernas.)

LIS - Mas eu vou morrer e ninguém vai se lembrar de mim.
FANDO - (Docemente) - Sim, Lis. Eu vou me lembrar de você e irei vê-la no cemitério com uma flor e um cachorro. (Longa pausa. Fando olha Lis. Emocionado.) - E no seu enterro cantarei baixinho o refrão "como é bonito um enterro, “Como é bonito um enterro", cuja música é muito engraçada. (Ele a olha silenciosamente e continua com ar satisfeito.) - Eu o farei por você.
LIS - Você me ama muito.
FANDO - Mas prefiro que você não morra. (Pausa) Vou ficar muito triste no dia que você morrer.
LIS - Ficar triste? Por que?
FANDO - (Desolado) - Não sei.
LIS - Você me diz isso, só porque ouviu dizer. Isso é sinal de que você não ficará triste. Você sempre me engana.
FANDO - Não, Lis, eu estou dizendo a verdade, vou ficar muito triste.
LIS - Você vai chorar?
FANDO - Farei um esforço, mas não sei se vou conseguir. Não sei se vou conseguir! Não sei se vou conseguir! Você acha que isso é uma resposta? Acredite em mim, Lis.
LIS - Mas acreditar em que?
FANDO - (Refletindo) - Não sei bem. Diga apenas que acredita em mim.
LIS - (Como um autômato) - Eu acredito em você.
FANDO - Mas nesse tom, não vale.
LIS - (Alegre) - Eu acredito em você.
FANDO - Assim também não vale, Lis. (Humildemente) - Fale direito, pois quando você quer, você sabe dizer muito bem as coisas.
LIS - (Num outro tom, também pouco sincero) - Eu acredito em você.
FANDO - (Abatido) Não, Lis, não. Não é assim. Tente outra vez.
LIS - (Faz um esforço, mas não são sinceras suas palavras) - Eu acredito em você.
FANDO - (Muito triste) - Não, não, Lis. Como você é, como se comporta mal comigo. Tente, mas direito.
LIS - (Sem ainda conseguir) - Eu acredito em você.
FANDO - (Violento) - Não, não, não é isso.
LIS - (Faz um esforço desesperado) - Eu acredito em você.
FANDO - (Violentíssimo) - Assim também não.
LIS - (Muito sincera) - Eu acredito em você.
FANDO - (Comovido) - Você acredita em mim, Lis! Você acredita em mim!
LIS - (Também comovida) - Eu acredito em você.
FANDO - Como eu sou feliz!
LIS - Eu acredito em você, porque quando fala, você parece um coelho e quando dorme comigo, você me deixa ficar com toda a coberta e fica sentindo frio.
FANDO - Isso não tem importância.
LIS - E sobretudo porque pelas manhãs você me banha na fonte e, assim, eu não tenho que me lavar, pois isso me aborrece muito.
FANDO - (Depois de uma pausa, resoluto) - Lis, quero fazer muitas coisas por você.
LIS - Quantas?
FANDO - (Reflete) - Quanto mais, melhor.
LIS - Então, o que você tem de fazer é lutar pela vida.
FANDO - Isso é muito difícil.
LIS - É assim que você pode fazer alguma coisa por mim.
FANDO - Lutar pela vida? Que coisas você diz! (Pausa) - Quase uma brincadeira. (Muito sério) - É que, Lis, não sei porque tenho que lutar pela vida e, talvez, se eu soubesse o porque, não teria forças; e inclusive, se eu tivesse forças, não sei se elas me serviriam para vencer.
LIS - Fando, faça um esforço.
FANDO - Fazer um esforço? (Pausa) - Talvez assim seja mais simples.
LIS - Temos que fazer um acordo.
FANDO - E você acha que isso nos ajudará?
LIS - Estou quase certa.
FANDO - (Pensa) - Mas, ajudar em que?
LIS - Não importa, o que interessa é que nos ajude.
FANDO - Para você tudo é muito simples.
LIS - Não, para mim também é difícil.
FANDO - Mas você tem soluções para tudo.
LIS - Não, eu nunca encontro soluções, o que ocorre é que me iludo dizendo que as tenho encontrado.
FANDO - Isso não vale.
LIS - Já sei que não vale, mas como ninguém me pergunta nada, dá no mesmo; além do mais, é muito bonito.
FANDO - Sim, está certo, é muito bonito. Mas e se alguém lhe perguntar alguma coisa?
LIS - Tanto faz. Ninguém pergunta nada. Todos estão muito atarefados buscando uma maneira de enganarem-se a si mesmos.
FANDO - Uh! Que complicado!
LIS - Sim, muito.
FANDO - (Comovido) - Como você é esperta, Lis!
LIS - Mas não me serve de nada, você sempre me faz sofrer.
FANDO - Não, Lis. Eu não lhe faço sofrer, muito pelo contrário.
LIS - Lembra-se de como você me pega quando pode.
FANDO - (Envergonhado) - É verdade. Não voltarei a fazer isso, você verá que não.
LIS - Você sempre me diz que não voltará a fazer, mas logo me atormenta o quanto pode e diz que vai me amarrar com uma corda para que eu não possa me mover. Você me faz chorar.
FANDO - (Terníssimo) - Fazia você chorar, principalmente, quando você estava naqueles dias. Não, Lis, não voltarei a fazer. Comprarei uma barca quando chegarmos a Tar e levarei você para ver um rio. Você quer, Lis?
LIS - Sim, Fando.
FANDO - E eu sentirei todas as suas dores, Lis, para que veja que eu não quero fazer você sofrer. (Pausa) - Terei filhos como você também.
LIS - (Comovida) - Como você é bom!
FANDO - Quer que eu lhe conte estórias bonitas, como a do homem que levava uma mulher paralítica, a caminho de Tar, num carrinho?
LIS - Primeiro, me leva pra passear.
FANDO - Sim, Lis. (Fando toma Lis nos braços e passeia com ela pela cena) - Olhe, Lis, como são bonitos o campo e a estrada.
LIS - Sim, como eu gosto!
FANDO - Olhe as pedras.
LIS - Sim, Fando, que pedras lindas!
FANDO - Olhe as flores.
LIS - Não tem flores, Fando.
FANDO - (Violento) - Dá no mesmo, olhe as flores.
LIS - Eu estou dizendo que não tem flores. (Lis fala agora num tom muito humilde, Fando, pelo contrário, se torna mais autoritário e violento por momentos.)
FANDO - (Gritando) - Eu disse para olhar as flores! Será que não entende?
LIS - Sim, Fando, me perdoa. (Longa pausa) - Como sofro por ser paralítica!
FANDO - É bom que seja paralítica, assim sou eu que levo você para passear. (Fando se cansa de carregar Lis nos braços ao mesmo tempo que se torna cada vez mais violento.)
LIS - (Bem docemente, temendo desagradar Fando) - Como está bonito o campo com suas flores e suas árvorezinhas.
FANDO - (Irritado) - Onde é que você está vendo árvores?
LIS - (Docemente) - Assim se diz: o campo com suas lindas árvores. (Pausa)
FANDO - Você é muito pesada. (Fando, sem nenhum cuidado, deixa Lis cair no chão.)
LIS - (Grita de dor) - Ai Fando! (Imediatamente com doçura, com medo de desagradar Fando) - Você me machucou!
FANDO - (Duramente) - Você ainda se queixa.
LIS - (Quase chorando) - Não, não me queixo. Muito obrigada, Fando. (Pausa) - Mas eu gostaria que você passeasse comigo no campo e me mostrasse as flores tão bonitas. (Fando, visivelmente desgostoso, segura Lis por uma perna e a arrasta pela cena.)
FANDO - Então, agora está vendo as flores? O que mais queria ver? Heim? Diga. Já viu o bastante?
LIS - (Soluça esforçando-se para que Fando não a ouça. Sem dúvida sofre muito) - Sim, sim. Obrigada... Fando.
FANDO - Ou quer que eu a carregue até o carrinho?
LIS - Sim, se não for incômodo. (Fando arrasta Lis pela mão até deixá-la junto ao carrinho)
FANDO - (Visivelmente chateado) - Eu tenho de fazer tudo pra você e ainda por cima você chora.
LIS - Me perdoa, Fando. (Ela soluça)
FANDO - Qualquer dia eu lhe deixarei e irei para bem longe de você.
LIS - (Chora) - Não, Fando, não me abandone. Eu só tenho você no mundo.
FANDO - Você não faz nada mais que me amolar. (Grita) - E não chora.
LIS - (Faz um esforço para não chorar) - Não estou chorando.
FANDO - Pare de chorar, eu já disse. Se você continuar chorando, vou me embora agora mesmo.
LIS - (Apesar de tentar impedi-lo, continua chorando)
FANDO - (Muito chateado) - Então você continua chorando, sempre, sempre, heim? Pois agora mesmo eu vou embora e não volto nunca mais. (Sai enfurecido. Depois de alguns instantes, Fando entra de novo, devagar e temeroso, até chegar onde está Lis.)
FANDO - Lis, me perdoe. (Humilde, Fando toma Lis nos braços e a beija. Depois ele a senta comodamente. Ela se deixa levar sem dizer nada)
FANDO - Eu nunca mais vou ser mau com você.
LIS - Como você é bom, Fando!
FANDO - Sim... Lis, você verá como eu vou me portar bem de agora em diante.
LIS - Sim, Fando.
FANDO - Me diga o que é que você quer.
LIS - Que nos coloquemos a caminho de Tar.
FANDO - Vamos partir imediatamente. (Fando toma Lis nos braços com muito cuidado e a coloca no carrinho) - Há muito tempo que nós estamos tentando chegar a Tar e não conseguimos nada.
LIS - Vamos tentar outra vez...
FANDO - Muito bem, Lis, como você quiser. (Fando empurra o carrinho que começa a cruzar lentamente a cena. Lis, dentro dele, olha para o fundo. Fando pára de repente, se dirige para Lis e lhe acaricia o rosto com as duas mãos. Pausa) - Eu peço perdão pelo que aconteceu. Eu não queria te fazer sofrer.
LIS - Eu sei disso, Fando.
FANDO - Confia em mim. Nunca mais vou fazer isso.
LIS - Sim, confio em você. Você é sempre muito bom comigo. Eu me lembro que quando eu estava no hospital, você me enviava cartas enormes, para que eu pudesse me gabar que recebia cartas tão grandes.
FANDO - (Envaidecido) - Isso não tem importância.
LIS - Também me lembro que, muitas vezes, como não tinha nada pra me contar, você me mandava um monte de papel higiênico para que a carta ficasse bem cheia.
FANDO - Isso não é nada, Lis.
LIS - Como eu ficava contente!
FANDO - Você está vendo como tem que confiar em mim?
LIS - Sim, Fando, eu confio.
FANDO - Sempre farei o que você mais goste.
LIS - Então, vamos nos apressar para chegarmos a Tar.
FANDO - (Triste) - Mas não chegaremos nunca. (Fando empurra o carrinho.)
LIS - Eu já sei, mas tentaremos.


(O carrinho, empurrado por Fando, sai de cena. Black-Out)

Fim do 1o quadro


QUADRO II

(Anoitece. Entra Fando entra em cena empurrando o carrinho no qual se encontra Lis. Pára. Lentamente, com muito cuidado, tira Lis do carro e a coloca no chão. Uma grossa corrente de ferro prende um dos pés de Lis ao carrinho. A corrente é bastante comprida. Fando vai falar num tom docemente desesperante.)
FANDO - Lis, estou muito cansado. Vou descansar um pouco. (Lis olha distraida.)- Estou dizendo que estou muito cansado e que vou me sentar um pouco. (Lis olha sacudindo a cabeça e inexpressiva.) - Você quer alguma coisa? Me diga se você quer alguma coisa. (Lis não responde) - Fale comigo, Lis, não se cale, diga alguma coisa. Eu sei o que é que você tem. Você está zangada comigo, porque depois de tanto andar não avançamos e estamos no mesmo lugar de sempre. (Parece que Lis não ouve nada.) - Lis, me responde. (Suplicando) - Deseja alguma coisa? Lis, fale comigo. (Fando continua falando num tom suplicante e lamentável) - Quer que eu lhe mude de posição? Você não está bem assim? (Lis não responde, Lis não faz o mínimo caso de Fando) - Já sei: você quer mudar de posição. (Fando, com muito cuidado, a muda de posição. Ela se deixa levar. Ele a trata com muita atenção) - Você vai ficar melhor assim. (Fando coloca as mãos sobre o rosto de Lis e a olha com entusiasmo) - Como você é bonita, Lis! (Fando a beija. Lis continua imóvel.) - Me diga alguma coisa, Lis. Fale comigo. Você está aborrecida? Quer que eu toque tambor para você? (Fando olha para Lis esperando uma resposta, depois continua muito contente) - Claro, vejo que você quer que eu toque tambor pra você. (Fando, muito contente, vai ao carrinho, pega o tambor e coloca na altura do estômago) - O que você quer que eu toque? (Lis nada fala. Silêncio) - Bom, eu vou tocar a canção da pena. Você gosta? (Silêncio) - Ou prefere que eu toque a canção da pena? (Silêncio. Lis não responde) - Como você quiser. (Ele vai começar a tocar o tambor, mas pára.) Estou com vergonha, Lis. (Silêncio) - Bem, vou fazer um esforço por você e vou tocar a canção da pena que você gosta tanto. (Ele vai começar, mas não se decide. Envergonhado) - Eu sinto muito por não saber outra canção além da canção da pena. (Pausa. De repente, Fando começa a tocar tambor de um modo muito sem jeito, enquanto canta com uma voz desafinada a seguinte canção.)


- A pena estava na cama
E a cama estava na pena. (bis)

FANDO - (Quando termina, pergunta a Lis) - Gostou, Lis? (Lis não diz nada. Fando muito entristecido vai até o carrinho para deixar o tambor. Antes disso, ele olha para Lis, retoma o tambor e toca de novo. Olha de soslaio para Lis, mas vê que sua música não faz efeito nela. Desencorajado, deixa o tambor junto ao carrinho. Mais triste que nunca) - Fale comigo, Lis. Diga-me alguma coisa. Como é que você quer continuar o caminho se não fala comigo? Estou cansado. Me sinto muito só. Fale comigo, Lis, diga alguma coisa. Conte-me qualquer coisa, mesmo que seja uma bobagem, mas diga alguma coisa. Você sabe falar muito bem quando você quer. Lis, não se esqueça de mim. (Pausa) - Eu vou te levar para Tar. (Pausa) - Às vezes você se cala e eu não sei o que o que está acontecendo com você. Não sei se está com fome, ou se quer flores ou se está com vontade urinar. Claro, eu posso me enganar, eu sei que você não tem nada do que me agradecer e inclusive pode estar zangada comigo, mas isso não é um motivo para não falar comigo. (Pausa) - Como sei que você quer ir para Tar, lhe coloquei no carrinho e a estou levando. Não me importam as dificuldades, só quero fazer aquilo que possa lhe agradar. (Silêncio) - Mas, Lis, fale comigo. (Lis olha sem expressão. Entram três homens: Mitaro, Namur e Toso. Namur anda entre seus dois amigos e segura um grande guarda-chuva preto que cobre os três. Formam um só bloco. Eles param longe de Lis e Fando para inspecionar o lugar sem dar a menos atenção a eles. Depois da inspeção, bastante minuciosa, da parte de Mitaro e Namur que chegam a cheirar o chão. De novo os três se reúnem debaixo do guarda-chuva)
TOSO - Sim, podemos dormir aqui.
MITARO - Mas antes, temos que saber de onde vem o vento. (Molha o dedo com cuspe e o levanta no ar)
NAMUR - Isso não importa. O importante é saber para onde ele vai.
TOSO - Vamos dormir debaixo do guarda-chuva, e deixemos em paz o vento.
MITARO - (Ofendido) - Você é sempre tão tranquilo.
NAMUR - (A Mitaro) - Se fossemos por ele, já estaríamos todos mortos.
MITARO - (A Namur) - Mortos ou pior ainda. E tudo por sua maldita mania de não tomar precauções.
TOSO - (Chateado) - O mais importante, creio eu, é dormir.
MITARO - O mais importante é saber de onde vem o vento.
NAMUR - (Corrigindo-o suavemente) - Não, o importante é saber para onde ele vai.
MITARO - Eu insisto em dizer que o importante é saber de onde vem o vento.
NAMUR - Enfim, não vou ser intransigente. Não quero ser como Toso. Como você quiser.
MITARO - (Muito satisfeito) - Então, ficamos de acordo que o importante é saber de onde vem o vento.
NAMUR - (Conciliador) - Pois é, saber de onde vem o vento. (Depois de uma breve pausa, continua num tom mais baixo) - ... E para onde vai depois de ter vindo.
TOSO - (Interrompendo) - Para mim, vocês podem dizer o que quiserem, mas o que é realmente importante é se colocar a dormir o mais rápido possível.
MITARO - (Com muita raiva) - É isso, não há nada mais simples, colocarmo-nos a dormir. E depois, o que?
NAMUR - Isso, isso, e depois, o que?
TOSO - Depois... nós veremos.
MITARO - Nós veremos! Assim acontecem as piores catástrofes, por não prevenir, por não tomar as mínimas precauções.
NAMUR - Exatamente, exatamente. E quanto tempo levaria para tomarmos as precauções? Praticamente um instante. Que riscos evitaríamos com nossas preocupações? Infinitos.
MITARO - Muito bem falado.
TOSO - Eu fico muito cansado tomando precauções.
MITARO - O cavalheiro se cansa.
TOSO - Além do mais, é muito difícil.
MITARO - Agora ele vai nos dizer que não pode fazer o menor esforço.
TOSO - Não é um pequeno esforço, é muito grande.
MITARO - O cavalheiro vai ficar com hérnia.
NAMUR - Talvez ele tenha razão, o esforço de prever é muito grande e muito complicado. E tomar as justas precauções é quase impossível.
MITARO - Sim, tenho que reconhecer. É um grande esforço, mas instantâneo, um esforço que dura pouco tempo.
NAMUR - Que dura pouco tempo? Depende da maneira como você o observa.
MITARO - Não venha com as suas histórias, agora, eu me lembro bem daquilo que você me disse outro dia de que dois fenômenos simultâneos para um observador terrestre, não o são para um observador planetário. Daí você deduzia que a simultaneidade era relativa e que em consequência o tempo também é algo relativo. Eu já disse que tudo isso não acredito nem um cabelo.
NAMUR - A única coisa que eu afirmo, é que o esforço não dura pouco tempo.
MITARO - (Enfadado, não sabendo o que responder, se cala, depois diz) - Mas nós nos afastamos do ponto central da questão que era saber de onde vem o vento.
NAMUR - Exatamente. Tentávamos saber de onde vem o vento... (Continua em tom mais baixo) - ... Para saber para onde ele vai.
MITARO - Estávamos simplesmente tomando as precauções para poder dormir tranquilamente, quando em seguida Toso disse que o importante era dormir.
TOSO - Mas...
NAMUR - (Interrompendo num tom indignado) - Reconhece, Toso, que até agora você nos impediu de dormir com as suas extravagâncias e a sua falta de solidariedade em relação as nossas posturas. (Toso não diz nada)
MITARO - Nem por um instante você parou para estudar com inteligência as nossas posições, mas ao contrário, você se afastou do nosso ponto de vista de uma maneira desconsiderada e destrutiva.
TOSO - Eu apenas disse que o importante era dormir debaixo do guarda-chuva o mais rápido possível.
NAMUR - (Indignado) - Que audácia! Você ainda se atreve reconhecer cinicamente, sem nos pedir perdão. No seu lugar, eu cairia a cara de vergonha. E nós continuamos discutindo por culpa sua.
MITARO - Exatamente, por sua culpa.
NAMUR - Você está vendo que eu renunciei a minha primeira posição que sustentava que o importante era saber de onde vem o vento, para conseguir um acordo mais rápido que nos facilitasse dormir rapidamente, e diga-se de passagem, como essa luz que me ilumina, que o importante é saber para onde vai o vento.
MITARO - (Sorridente, mas incisivo) - Sem querer lhe contradizer, demasiadamente, quero deixar bem claro que o importante é saber de onde vem o vento.
NAMUR - (Procura sorrir para dissimular a sua cólera) - Eu me permito assegurar que todo o mundo estará de acordo em reconhecer que o importante é saber para onde vai o vento.

(Fando que seguia a conversa dos homens de guarda-chuva, muito interessado, se dirige a eles)

FANDO - (Envergonhado) - Desculpe. Com licença. De lá (mostra o lugar onde estava antes) - era muito bonito ouvir como vocês discutem. Como vocês falam bem! Deixam que eu discuta também?

(Os três homens se olham muito chateadíssimos)

FANDO - Deixem-me discutir com vocês. (Pausa) - Ela não quer falar comigo e eu gostaria de contar muitas coisas a alguém. Estou só.

(Os três homens do guarda-chuva, no limite do enfado, se deitam no chão, debaixo do guarda-chuva e começam a dormir)

FANDO - (Humildemente) - Eu sei fazer muitas coisas. Eu posso ajudá-los se vocês falarem comigo. (Pausa. Ele continua um pouco envergonhado) - Eu também sei tocar tambor. (Ele ri timidamente) - Não muito bem, mas eu sei lindas canções como a canção da pena. Vocês vão ouvir o que é bom.

(Fando vai buscar o seu tambor. Os homens do guarda-chuva dormem conscienciosamente, um deles ronca)

FANDO - (Enquanto coloca o tambor em posição conveniente) - Eu vou tocar e cantar para vocês, mas com a condição de que falem comigo. (Vai até eles) - Vocês não estão me ouvindo? (Fando comprova que eles estão dormindo. Ele volta tristemente para Lis) - Eles não me deram a menor atenção, Lis, não querem me ouvir. Tenho muitas coisas para dizer a eles e, além do mais, eu ia cantar a canção da pena.

(Silêncio. Lis continua sem olhá-lo)

FANDO - (Para Lis, docemente) - Lis, você é melhor do que eles. Você sabe dizer coisas lindas. Fale comigo.

(Lis continua em silêncio)

FANDO - Quer que eu faça uma exibição para lhe agradar? Vou fazer acrobacias, heim?

(Lis continua em silêncio. Fando executa uma série de exercícios que são uma mistura de ballet, palhaçadas e gestos de bêbado. Por fim, sustentando-se sobre uma perna, une o joelho da outra com o cotovelo, enquanto que com a mão do mesmo braço ele faz caretas, colocando o polegar na ponta do nariz, enquanto grita entusiasmado.)

FANDO - Olhe como é difícil. Lis, olhe como é difícil!

(Lis continua calada. Fando, em silêncio e abatido, termina seu número, vai até Lis e dá uma volta em torno dela cheio de tristeza. Silêncio)

FANDO - (Num tom de queixa, ainda sem gritar) - Fale comigo, Lis, fale comigo.

Fim do 2o quadro.

Black-Out

QUADRO III

(Os homens do guarda-chuva - Namur, Mitaro e Toso - conversam com Fando. A alguns metros deles está Lis, no carrinho)

NAMUR – Já levamos muitos anos tentando isso.
FANDO - Ouvi dizer que é impossível chegar.
NAMUR - Não, não é que seja impossível. O que acontece é que até hoje ninguém chegou e ninguém espera chegar.
MITARO – O que já não é tão complicado é tentá-lo.
FANDO - Então, ela e eu não chegaremos nunca?
MITARO - Você está em melhores condições que nós. Você tem um carrinho. Assim pode andar melhor e mais depressa.
FANDO – Sim, é claro que eu ando mais depressa, mas sempre volto ao mesmo lugar.
MITARO - Conosco acontece o mesmo.
NAMUR - Mas isso não é o mais grave, o pior é que nunca tomamos precauções.
MITARO - Sim, Namur tem razão, isso é o pior. Como teríamos adiantado se tivéssemos tomado precauções.
TOSO - (Chateado) - Vocês continuam com histórias de precauções. Eu já disse que o importante é seguir nosso caminho.
NAMUR - (Desolado) - Para sermos exatos, o que nos impede chegar a Tar é ele, Toso, sempre em contradição, sempre colocando-se contra nós.
MITARO - Não é que nós, Namur e eu, pensamos da mesma maneira ou tenhamos as mesmas idéias mas, afinal, chegamos a um acordo, mas ele... Ele é o culpado por ainda não termos chegado a Tar. Ontem, sem ir mais longe...
NAMUR - (Cortando) – Sim, sobre o vento e o dormir.
MITARO – Sim..., isso, isso.
FANDO - (Lembrando-se entusiasmado) - Oh, como vocês falavam bem, como era bonito!
NAMUR - (Ironico) – Sim, sim, bonito...
MITARO - O senhor não ouvia o que dizíamos?
FANDO - Sim, mas não prestava atenção, somente ouvia a música. Soava muito bem. (Cantarolando) – “Patati, patatá, simimi, simimó, que se o, que se a...”
NAMUR - É verdade. Que bonito devia ser.
FANDO - Lá de longe, era muito bonito de ouvir.
MITARO - É o tédio, ficava muito bem de longe, soa bem, mas o que acontece?
NAMUR - O pior, o mais triste.
MITARO - Não conseguimos evitá-lo: está sempre metendo discórdia em nossa unidade. Ele é, sem dúvida, um porco.
NAMUR – Pior ainda que um porco. (Namur pensa. Silêncio)
FANDO - (Intervindo) - O que é que o senhor disse? Que existe pior que um porco, que existe melhor que um porco?
NAMUR – Olha, olha, quer dizer que este tio é um perito em matéria de animais.
FANDO - Não, eu somente pergunto se o que ele (aponta para Mitaro) procura são animais melhores ou piores que o porco.
MITARO - (Depois de longa pausa) – Me esqueci.
NAMUR – (Recriminando-o) – Sempre tão esquecido e tão filantrópico!
MITARO - (Chateado) - Você se dá conta de como sempre quer me insultar? (Pensa) - Para que veja, para lhe irritar, eu me lembro muito bem do que perguntei, que foi quais são os animais piores que o porco e quais são os melhores.
FANDO - (Muito contente, fala precipitadamente) - Eu sei. Os piores são o leão, a barata, a cabra e o gato. E os melhores são a vaca, o coelho, a ovelha, o papagaio e o canguru.
NAMUR - O canguru?
FANDO - Sim, o canguru.
NAMUR - Você disse que o canguru é pior?
FANDO - (Um pouco envergonhado) – Sim, sim.
NAMUR - Você tem certeza?
FANDO - Tenho.
NAMUR - Mas... certeza, certeza?
FANDO - (Abatido) - O senhor coloca as coisas de uma tal maneira que lança a dúvida no meu espírito.
NAMUR - (Cruel) - Mas... certeza, certeza, certeza?
FANDO - (Chorando) - O senhor é demasiado forte.
MITARO - (Reprovando a Namur) - Você fez ele chorar.
NAMUR – Mas é que o tio não tem certeza de nada e se permite coisa que na verdade...
MITARO – Mas você fez ele chorar como se fosse um homem que vai para Tar com uma mulher dentro de um carrinho.
FANDO - (Desculpando-se) - Mas eu chorei muito pouco: duas lágrimas.
TOSO - (Obstinado) - Acho que o que teríamos que fazer é discutir menos e tentar chegar a Tar.
MITARO - (Satisfeito e ofendido) – O senhor está vendo? Sempre assim. Quando vamos nos por a caminho, quando estamos em vias de encontrar um acordo, então ele ataca com uma bobagem.
NAMUR - É insuportável.
FANDO – Então, por que viajam com ele?
NAMUR - Levaria muito tempo pra contar.
MITARO - Uma eternidade.
TOSO - (Inflexível) – Deixemos de tanta discussão e vamos em direção a Tar.
MITARO - (Repreendendo Toso) - É assim que nos ajuda? Estamos tentando terminar a discussão com esse homem para caminhar em direção a Tar e o que é que você faz? Nos importuna, nos chateia dia e noite.
NAMUR - Como você é destrutivo! Como é pouco social!
MITARO - (A Fando) - O senhor está vendo! É lamentável, o senhor não acha?
FANDO – Sim, verdadeiramente. (Silêncio)
MITARO – O senhor sim é que é feliz com ela.
FANDO – Sim, é verdade, ela não me incomoda em nada. Ela é encantadora.
MITARO - Que sorte!
FANDO - Venha vê-la.

(Mitaro e Namur vão com Fando ver Lis que está no carrinho. Lis, com os olhos bem abertos, parece ausente e se deixa levar sem o menor gesto)

FANDO - (Entusiasmo) - Olhem para ela. (Fando move a cabeça de Lis, colocando-a em diversos ângulos, enquanto diz:) – Olhem como ela é bonita!
MITARO - Sim, ela é muito bonita.
FANDO - Abaixem-se para vê-la por baixo, em perspectiva.

(Mitaro e Namur, de cócoras, olham Lis. Fando continua colocando-a em diferentes posições)

FANDO - Venham aqui, os senhores vão ver como é bonito. (Os dois homens se aproximam do carrinho) – Olhem que pernas bonitas e como o pano da sua combinação é suave. Toquem-na.

(Mitaro e Namur tocam a combinação)

MITARO - É verdade, que pano suave.
FANDO - (Realmente satisfeito) - Olhem suas coxas, tão brancas e tão suaves. (Fando levanta a combinação de Lis para que os homens vejam suas coxas)

MITARO - É verdade, como são brancas e como são bonitas.

(Fando arruma a combinação com muito cuidado)

FANDO - O que eu mais gosto é de beijá-la. Seu rosto é muito suave. Dá gosto acariciá-lo. Experimentem.
MITARO – Agora?
FANDO – Sim, acariciem assim. (Fando, com as duas mãos acaricia o rosto de Lis e as escorrega ternamente) – Venham, podem acariciá-la, vocês vão ver como é bom.

(Mitaro acaricia o rosto de Lis com uma das mãos)

FANDO - Não, com as duas mãos.

(Mitaro, com muito respeito a acaricia)

FANDO - Então, o que acha?
MITARO - (Entusiasmado) - Ótimo.
FANDO – Você também. (Apontando Namur)

(Namur a acaricia)
FANDO – Beijem-na também, como eu. (Fando beija rapidamente Lis na boca) – Façam isso, vão ver como é bom. (Namur e Mitaro beijam Lis, com muito respeito, nos lábios. Lis continua inexpressiva) – Então, gostou?
MITARO E NAMUR – Sim, muito.
FANDO - (Muito satisfeito) - Pois é minha noiva.
MITARO - Para sempre?
FANDO - Sim, para sempre.
MITARO – E, nunca se cansa?
TOSO - (Interrompendo-os) - Quando é que vamos nos pôr a caminho para Tar?
MITARO - (Depois de uma pausa) – O senhor está vendo como ele é?
FANDO - Sim.
NAMUR - Nunca nos deixa terminar.
TOSO - O que estou dizendo é que devemos nos pôr a caminho para Tar o quanto antes.
MITARO - (Indulgente) - Desculpe todas as suas falhas. Ele é assim e nasceu assim. Contra isso não há nada a fazer.
NAMUR - Não adianta ensinar nada para ele, é inútil. Quando vamos fazer alguma coisa, na mesma hora ele começa a nos perturbar com suas complicações. Ele nunca nos deixa entrar em acordo.
FANDO - Mas talvez ele tenha razão nisso de que o bom é nos por a caminho.
NAMUR - Razão, o que se diz razão, ele sempre tem um pouco.
MITARO - É preciso reconhecer que não vai falar por falar.
NAMUR – Isso é, se olharmos bem de perto, às vezes, ele tem alguma razão, não muita, naturalmente, mas alguma coisa sim...
MITARO - Talvez seja o maior inconveniente para nós. Eu vou explicar: nós sempre encontramos uma base de razão em tudo o que ele diz, ainda que muito distante.
NAMUR - Distantissíssima.
MITARO – Sim, sim, muito distante, mas ao menos sempre encontramos uma base. Por isso, apesar de acharmos suas proposições absurdas e dissolúveis, sempre as aceitamos e as discutimos e, inclusive, nos esforçamos em lhe mostrar os pontos bons e os pontos maus daquilo que ele diz.
TOSO – O que eu creio é que devemos nos pôr a caminho para Tar.
NAMUR - (Muito satisfeito) – O senhor está vendo?
MITARO - (Também satisfeito) – O senhor se dá conta?
FANDO – Sim, sim, estou vendo.
MITARO - Seria tão simples que ele se calasse.
FANDO - É simples se calar?
MITARO - Não estou dizendo que não faça falta tomar as devidas precauções, e inclusive ter experiência, mas se se tenta de verdade, pode-se ficar calado.
FANDO - Pois eu tentei um dia... e não pense o senhor que o caminho é de rosas!
NAMUR - Ah! Que homem interessante! Quantas coisas ele fez!
MITARO - E o que aconteceu, quando o senhor tentou?
FANDO - (Corando) - Foi divertido.
MITARO – Conte-nos, conte-nos! Ah! Que interessante!
NAMUR – Como foi? O que fez?
FANDO – Eu me levantei pela manhã e me disse: "Hoje passarei todo o dia calado".
NAMUR - (Procurando compreender, repete em voz alta) – Se levantou pela manhã e disse a si mesmo: "Hoje passarei todo o dia calado".
FANDO - (Continua) - E, então...
NAMUR - (Interrompendo de novo) - Há uma coisa que não entendo bem. Se o senhor nos disse que tentava passar o dia calado, como é que falou?
MITARO - Não seja estúpido, ele falou mentalmente.
NAMUR - Ah! Isso muda tudo.
MITARO – Continue, continue que isso é muito interessante.
FANDO - Então, decidido a não falar, comecei a pensar no que poderia fazer para compensar o silêncio e me pus a andar de um lado para o outro.
NAMUR - O senhor devia estar muito contente.
FANDO - No princípio, sim. Eu andava e andava. Mas logo aconteceu o pior. (Fando se cala)
NAMUR - (Muito interessado) - O que aconteceu?
MITARO - Conte, conte.
FANDO - Não, não vou contar, é muito íntimo.
NAMUR - E vai nos deixar assim, com o mel nos lábios?
FANDO - É melhor que eu me cale agora... a história acaba mal.
NAMUR - Mas muito mal?
FANDO - (A ponto de chorar) – Sim, sim, muito mal.
NAMUR - Que pena!
MITARO - É verdade! Como é triste!
TOSO – Melhor será nos pôr a caminho para Tar.
MITARO - (Silêncio e consternação) - O senhor está vendo? Para que insistir?
FANDO – Sim, sim, verdadeiramente.
MITARO - É o que mais gosto no senhor. O senhor nos compreende. Porque às vezes, nem isso. Outro dia nos encontramos com outro homem que também ia para Tar e que se empenhava em dar-lhe razão o tempo todo.
FANDO - Eu logo me dei conta de que eram os senhores que tinham razão e não ele. Desde que começaram a discussão sobre o vento que eu me dei conta.
MITARO - E como é que o senhor compreendeu tão rápido?
FANDO – Eu me disse...
NAMUR - (Interrompendo) - Mentalmente?
MITARO - Claro, homem!
NAMUR - (Assombrado) – Olha cara! Ele fala mentalmente!
FANDO - Então eu me disse: terá razão o primeiro que disser a palavra "onde" e como os senhores a disseram antes dele, soube que ele não tinha razão.
NAMUR - (Entusiasmado) – Pois é um bom procedimento para saber quem tem razão.
FANDO – Sim, é muito bom.
NAMUR – E, sempre o emprega?
FANDO - Quase sempre.
MITARO - Assim, o senhor deve ter muita experiência.
FANDO - Sim, não me falta. Apesar de às vezes empregar outros sistemas.
NAMUR - (No cúmulo do assombro) - Outros sistemas?
FANDO - (Lisonjeado) – Pois claro!
NAMUR - Que cara fecundo!
MITARO - Que preocupação em saber aonde está a razão.
FANDO - Desde a infância eu utilizo sistemas infalíveis para reconhecê-la.
NAMUR - Isso é o que deveríamos ter feito e não perder tempo como temos perdido.
MITARO – Já não é hora de se lamentar.
NAMUR - (Magoado) – Sim, claro. (Pausa) – E que outros procedimentos o senhor utiliza para saber quem tem a razão?
FANDO - Outro que também tenho empregado é o dos dias da semana, mas é muito complicado.
MITARO - (Interessado) - Como é?
FANDO - É assim: nos dias múltiplos de três, têm razão os senhores de idade, nos dias pares têm razão as mães e, nos dias terminados em zero, ninguém tem razão.
MITARO - (Entusiasmado) - Mas é muito bom!
FANDO - Mas é muito complicado: tem que se estar sempre atento ao dia que é e ter bastante cuidado para não se confundir. Foi assim que alguns dias eu dei razão quem não tinha.
MITARO - (Alarmado) – Muito grave!
FANDO - Gravíssimo! Muitas vezes, isso impedia que me crescessem as unhas.
MITARO – Se compreende que o senhor prefira o sistema atual.
FANDO – Acontece que, olhando bem, é mais simples.
NAMUR - Mais simples? E se ninguém disser a palavra "onde"?
FANDO - Eu previ tudo. Se em cinco minutos, ninguém disser a palavra "onde", dou razão ao primeiro que disser a palavra "mosca".
MITARO - (Com assombro) - Perfeito!
FANDO - (Satisfeito) – Sim, sim, sem dúvida é um sistema perfeito.
NAMUR - E se ninguém disser a palavra "mosca".
FANDO - Então, eu troco pela palavra "árvore".
MITARO - (Assombrado) – Como o senhor prevê tudo!
FANDO - (Lisonjeado) - Sim, não posso me queixar.
NAMUR - E se ninguém disser a palavra "árvore"?
FANDO - Então, eu dou razão ao primeiro que disser a palavra "água".
MITARO - (No cúmulo do assombro) – Caramba, que quantidade de previsões!
FANDO - (Muito satisfeito) - Eu prefiro sempre fazer uma coisa completa. Com o tempo, fica melhor assim, apesar de ser mais difícil no começo.
NAMUR - (Odioso) - E se ninguém disser a palavra "água"?

(Fando e Mitaro olham Namur com rancor. Silêncio. Namur se envergonha)

NAMUR - Eu só pergunto o que acontece se ninguém disser a palavra "água". Eu não quero ofendê-lo.
MITARO – (Magoado) – Não somente ofendê-lo, mas parece que você tem uma implicância com ele.
NAMUR - (Aturdido) - Está bem, está bem, não perguntei nada.
MITARO – Assim é melhor.
NAMUR - (Baixo) - Mas eu sei que se ninguém disser a palavra "água", estará afundado todo o sistema.
MITARO – (Ofendidíssimo) – Você é teimoso que nem Toso.
FANDO – Não tem importância. Tenho tudo previsto. Se ninguém disser a palavra "água" eu dou razão ao primeiro que disser (dúvida) - que disser (pensa) - que disser a palavra... a palavra... "palavra"!
NAMUR - Isso não vale, o senhor acabou de inventar.
MITARO - Você me envergonha, Namur, com suas incorreções.
FANDO - Não, não é verdade, eu não acabei de inventar.
NAMUR - Então, nos diga uma coisa: quando fez essa experiência?
FANDO - (Envergonhado) - A verdade é que eu não experimentei ainda..
NAMUR - (A Mitaro) - Está vendo, está vendo?
TOSO - (Interrompendo) - Quando vamos nos pôr a caminho para Tar? (Silêncio. Os três se olham, impressionados com a pergunta de Toso)
MITARO – É verdade, devíamos nos pôr a caminho.
FANDO – Me deixam ir com os senhores?
NAMUR - Conosco?
FANDO - Sim, com os senhores.
NAMUR - Não sei. É preciso saber se os três estamos de acordo. (A Mitaro) – Você, qual é sua opinião?
MITARO – (Com desprezo) –Bom, que venha.
NAMUR - (Falando quase no ouvido de Mitaro, para que Fando não o ouça) – Temos que levar em conta que ele vem com uma mulher e um carrinho. Não podemos nos permitir tamanha companhia. É muita responsabilidade.
MITARO – Bom, e daí?
NAMUR - (Quase tendo uma congestão) – Cuidado que ele vai nos ouvir. (Fando começa a assobiar para que eles entendam que ele não está ouvindo) - Você pensou bem em tudo que nos pode acontecer? Pense bem. Nada mais e nada menos que uma mulher e um carrinho. Você percebe a responsabilidade que pesará sobre nós? Você se dá conta da quantidade de precauções que teremos que tomar?
MITARO – Sim, sim, e daí? Dá no mesmo.
NAMUR - (Continua falando ao ouvido de Mitaro) – Dá no mesmo! Dá no mesmo! É o que você diz agora! Depois não venha me dizer que não o avisei. (Falando alto, para que Fando ouça, com um visível mau humor, apesar do sorriso forçado) – Bem, então você, Mitaro, está de acordo que ele venha conosco?
MITARO - (Chateado) - Quantas vezes tenho de lhe repetir?
NAMUR - Bem, bem. (Para Toso) - E você, Toso?
TOSO – Eu, o que quero é que nos ponhamos a caminho de uma vez. Para mim tanto faz se vamos com esse senhor ou sem ele.
NAMUR - (Contrariado, mas sorridente) - Assim, acontece que estamos todos de acordo. O senhor pode vir conosco.
FANDO – Onde?
NAMUR – O senhor ainda pergunta onde? A Tar. Onde o senhor queria ir?
FANDO – Mas, para que temos que ir a Tar?
NAMUR – Que pergunta!
FANDO – É que é tão importante assim?
NAMUR – Mas este homem nos saiu completamente tonto do cu!
FANDO – (Desculpando-se) – É que eu não sabia...
NAMUR – E o senhor poderia deixar de tentar chegar a Tar?
FANDO – (Envergonhado) – Não.
NAMUR – O senhor está vendo? Tentará sempre. Isso demonstra o importante que é.
FANDO – Ah, bem!
MITARO - Nós vamos nos pôr a caminho.

(Os três homens se abrigam em bloco debaixo do guarda-chuva. Fando coloca Lis confortavelmente no carrinho)

FANDO – E quando chegaremos?
NAMUR - Isso ninguém sabe.
FANDO – Eu não ouvi que ninguém tenha chegado, apesar de que quase todo mundo tenha tentado.
NAMUR – Tagarelices!
MITARO – Sim, sim, tagarelices... Mas são certas.
NAMUR – Verdade é que ninguém ainda chegou a Tar.

(Os três homens debaixo do guarda-chuva começam a andar para sair de cena. Fando os segue empurrando o carrinho onde está Lis.)

FANDO – Eu também ouvi que é impossível chegar.
MITARO – Mas sempre fica a esperança.

(Todos saem lentamente. Black-Out)

Fim do 3o Quadro

QUADRO IV

(Fando entra em cena empurrando o carrinho em que está Lis. Fando pára)

FANDO - O que há você?
LIS - Estou doente.
FANDO - O que quer que eu faça, Lis?
LIS - Me tira do carrinho.

(Fando segura Lis com muito cuidado e a desce do carrinho. Lis tem uma comprida corrente de ferro que prende seu calcanhar ao carrinho)

FANDO - Onde é que dói?
LIS - Não sei.
FANDO - Que doença você tem?
LIS - Não sei.
FANDO – Isso é o pior, se eu soubesse que doença você tem, tudo mudaria.
LIS - Mas eu me sento muito mal.
FANDO - (Com muita tristeza) – Você não vai morrer.
LIS – Tenho um mal-estar muito grande. Me sento muito mal, Fando.
FANDO - Que pena que os homens do guarda-chuva não estejam aqui. Eles sabem muitas coisas. Na certa eles curariam você.
LIS – Mas eles devem estar ainda muito longe, você andou muito depressa.
FANDO – Sim, estou em grande vantagem. (Contente) - E no entanto nós saimos na mesma hora; mas eu tenho o carrinho.
LIS – Mas outra vez voltamos ao mesmo lugar. Não adiantamos nada.
FANDO - Como você é pessimista. O importante é que nós levamos vantagem em relação a eles.
LIS - Você correu muito, andou muito depressa. Essa rapidez não me fez bem. Eu já lhe disse isso.
FANDO - (Envergonhado) - É verdade, Lis, me perdoa.
LIS - Você sempre me pede perdão, mas nunca me leva em consideração.
FANDO – É verdade, como eu sou mau com você... (Pausa)
LIS - E ainda por cima você sempre diz que vai me algemar as mãos, como se não bastasse a corrente.
FANDO - Não, não vou algemar você. (Pausa)
LIS - Você nunca me considera. Lembra-se de como às vezes, antes de eu ficar paralítica, você me amarrava na cama e me batia com a correia?!
FANDO - Eu não sabia que lhe maltratava.
LIS – Mas eu dizia sempre. Quantas vezes eu disse que não podia suportar o mal que você me fazia!
FANDO - Lis, me perdoe. Eu não voltarei a lhe amarrar na cama a lhe bater com a correia, Eu prometo.
LIS - Depois entrou numa de me amarrar com a corrente que me impede de afastar do carrinho, apenas posso me arrastar.
FANDO - É verdade, Lis. Você devia ter me avisado.
LIS - Eu sempre lhe digo tudo, mas você nunca me ouve.
FANDO - Lis, não fique zangada comigo, me beija!
LIS - (Com resignação) - Você pensa que assim tudo se ajeita arranja?
FANDO - Você me atormenta, Lis. (Abatido. Silêncio. Continua contente) - Em quem vou dar um beijinho na boquinha?
LIS - Não são brincadeiras, Fando.
FANDO - Lis, não brigue comigo,eu sei que sou culpado, mas não brigue comigo que vou ficar muito triste.
LIS - Não pense que assm se ajeita tudo.
FANDO - Me beija, Lis. (Lis, muito séria e sem expressão, permite que Fando, apaixonadamente, a beije) - Esqueça todas estas coisas e não me faça pensar nelas.

(Silêncio)

LIS - Ontem você inventou de me deixar nua toda a noite na estrada e sem dúvida é por isso que eu estou doente.
FANDO - Mas eu fiz isso para a vissem os homens que passassem: para que todo mundo visse como você é bonita.
LIS - Fazia muito frio. Eu estava tremendo.
FANDO - Pobre, Lis... Mas os homens a olhavam e ficaram muito felizes e é claro depois deviam ter continuado o caminho com mais alegria.
LIS - Eu me sentia muito só e com muito frio.
FANDO - Eu estava do seu lado. Você não me viu? Além do mais, muitos homens a acariciaram quando lhes pedi. (Pausa) - Mas eu nunca mais vou fazer isso, Lis, estou vendo que você não gosta.
LIS - Você sempre diz isso.
FANDO - É que as vezes você é estranha e não percebe que tudo o que eu faço é para o seu bem. (Pausa. Ele se lembra) - Você estava muito bonita toda nua. Era um espetáculo maravilhoso.
LIS - O mais entediado é sempre pra mim.
FANDO - Não, Lis. Que pena que você não tenha os meus olhos para ver a si mesma.
LIS - Fando, eu estou muito mal. Me sinto muito mal.
FANDO - O que quer que eu faça por você, Lis?
LIS - Agora não há mais remédio. (Pausa) - O que eu quero é que você me trate sempre bem.
FANDO - Sim, Lis, lhe tratarei bem.
LIS - Mas faça um esforço.
FANDO - Está bem, vou fazer.

(Pausa. Lis percebe um volume na calça de Fando.)

LIS - O que é que você tem no bolso?

(Fando como uma criança apanhada fazendo uma bobagem, procura disfarçar)

FANDO - Uma coisa.
LIS - Me diz o que é.
FANDO - Não, não.
LIS - (Autoritária) - Me mostra o que você está escondendo!
FANDO - Não é nada demais.
LIS - Eu já disse pra me mostrar!

(Fando tira do bolso, envergonhado, algemas de ferro)

LIS - Está vendo? As algemas!
FANDO - Mas não é pra fazer nada de mal. É só pra brincar.
LIS - Está vendo? Você está apenas esperando um descuido meu, para colocá-las.
FANDO - Não, Lis, eu não vou colocar em você.
LIS - Então, jogue fora!
FANDO - (Agressivo) - Não! (Torna a guardá-las)
LIS - (Quase chorando) - Vê como me trata.
FANDO - (Muito comovido) - Lis, não chore. Lis, eu amo você, muito. Não chore, Lis.

(Lis o abraça apaixonadamente)

LIS - Não me deixe, Fando. Só tenho a você. Não me trate tão mal.
FANDO - (Comovido) - Como eu sou mau com você! Mas agora você vai ver como é que eu vou ser bom.
LIS - Me aperte nos braça, Fando, me abraça. (Eles se abraçam com paixão) - Estou me sentindo muito mal.
FANDO - Você já vai ficar boa e então nos poremos a caminho para Tar e nós passaremos muito bem e eu te darei de presente todos os animais da terra para que você brinque com eles: as baratas, os escaravelhos, as borboletas, as formiguinhas, os sapos... E cantaremos juntos e eu tocarei tambor todos os dias.
LIS - Sim, Fando, seremos felizes.
FANDO - E vamos continuar caminhando para Tar.
LIS - É, isso mesmo, para Tar.
FANDO - Os dois juntos.
LIS – Sim, sim, os dois juntos.

(Pausa. Eles se olham mutuamente)

FANDO - E quando chegarmos a Tar, sim, então seremos felizes.
LIS - Como você é bom, Fando! Como me trata bem!
FANDO - Sim, Lis. Tudo farei por você, porque amo muito você.

(Fando vai até o carrinho e desamarra o tambor com muito cuidado. Depois, com muito respeito, ele o mostra a Lis)

FANDO - Olhe o tambor, Lis.
LIS - Como é bonito!
FANDO - Olhe como é redondinho.
LIS - Sim, é verdade que é redondinho.
FANDO - Pois bem, eu só o tenho para cantar canções para você.
LIS - Como você é bom!
FANDO - Quando chegarmos a Tar, como seremos felizes! Eu inventarei novas canções para você.
LIS - A canção da pena é muito bonita.
FANDO - (Lisonjeado) - Ah, não tem importância! Inventarei outras coisas muito melhores. Outras que não só fale das penas, mas também de... (reflete) – de penas de pássaros e também... penas de águia e também... ( reflete, mas não acha nada) - ... e também de...
LIS - E também mercados de penas.
FANDO – (Contente) - Sim, sim, e também de penas e também de... de... ah, e também penas.
LIS - Que lindas canções! Como você é bom, Fando!

(Pausa. Fando tira de repente as algemas do bolso e olha para elas nervosamente)

LIS - Não me faça sofrer.
FANDO - (Duramente) - Por que você acha que vou lhe fazer sofrer?
LIS – (Suave) – Não me fale nesse tom, Fando.
FANDO - (Entediado, se levanta e responte) - Eu falo com você sempre no mesmo tom.
LIS - O que é que você está pretendendo?
FANDO - (Violento) - Nada.
LIS – Se está querendo fazer alguma maldade, você vai ver.
FANDO - (Violentamente) - Lá vem você com as suas coisas.
LIS - (Humilde) - Sei muito bem que você quer me colocar as algemas. Não faça isso, Fando. (Ela soluça)
FANDO - (Com aspereza) - Não chora.
LIS - (Se esforça para não chorar) - Não, não vou chorar, mas me ponha as algemas.
FANDO - (Irritado) - Você sempre desconfia de mim.
LIS - (Com doçura) - Não, não desconfio de você. (Muito sincera ela continua) - Acredito em você.

(Fando dá alguns passos entre o carrinho e Lis. Ela chora)

FANDO - (Autoritário) - Me dê as mãos.
LIS - Não, não faça isso, Fando. Não me ponha as algemas.

(Lis estende as mãos. Fando coloca as algemas nervosamente)

FANDO – Assim é melhor.
LIS - Fando. (Muito triste) - Fando.
FANDO - Eu coloquei para ver se você pode se arrastar com elas. Vá, tente se arrastar.
LIS - Eu não posso, Fando.
FANDO - Tente.
LIS - Fando, não me faça sofrer.
FANDO - (Fora de si) - Eu já lhe disse pra tentar. Vá, se arraste.

(Lis tenta se arrastar, mas não consegue; suas mãos unidas pelas algemas a impedem)

LIS - Não posso, Fando.
FANDO - Tente, ou será pior para você.
LIS - (Docemente) - Não me bata, Fando, não me bata.
FANDO - Tente, eu já disse.

(Lis faz um grande esforço sem conseguir se arrastar.)

LIS - Não posso, Fando.
FANDO - Tente outra vez.
LIS - Não posso, Fando. Me deixa. Não me faça sofrer.
FANDO - Tente, ou será pior para você..
LIS - Não me bata. Sobretudo, não me bata com a correia.
FANDO - (Irritado) - Tente.
LIS - Não posso.

(Fando vai ao carrinho e pega a correia)

FANDO - Tente ou vou lhe bater.
LIS - Fando, não me bata. Estou doente.

(Fando açoita em Lis com violência)

FANDO - Arraste-se.

(Lis faz um esforço supremo e consegue se arrastar. Fando a contempla palpitante de emoção)

LIS - Não posso mais.
FANDO - Mais, mais.
LIS - Não me bata mais.
FANDO - Arraste-se.

(Fando volta a açoitá-la. Lis se arrasta com dificuldade. Num falso movimento, esbarra suas mãos amarradas no tambor e rasgam o couro)

FANDO - (Colérico) - Você rasgou o meu tambor. Você rasgou o meu tambor.

(Fando a açoita. Ela cai desmaiada cuspindo sangue pela boca. Fando, irritado, pega o tambor e, distante dela, começa a consertá-lo. Lis, deitada e inerte com as mãos amarradas sobre o peito, está no meio da cena. Longo silêncio. Fando trabalha. Entram os três homens do guarda-chuva. Aproximam-se da mulher. Eles a observam com muita atenção, dando voltas em torno dela. Nem Fando, absorvido endireitando o tambor, não os vê e eles também não percebem Fando)

MITARO - Olhe o que ela tem nas mãos.
NAMUR - (Levanta as mãos de Lis para ver bem as algemas) - São algemas.
MITARO – É bonito, não é verdade?
NAMUR – Não muito.
MITARO - Que necessidade você tem em contradizer?
TOSO - (Interrompendo e num tom neutro) - Ela tem sangue na boca.

(Mitaro e Namur olham atentamente a boca de Lis)

MITARO – Pois é verdade.
NAMUR - Isso é que é estranho.

(Namur segura os lábios de Lis com os dedos como se fossem pinças e lhe abre a boca. Mitaro coloca o seu dedo na boca de Lis. Tira e cheira)

MITARO – Cheira a sangue.
NAMUR - Tudo isso é muito estranho.

(Mitaro toca com os dedos os dentes de Lis)

MITARO - Olhe que dentes pequenos ela tem. Como são duros!
NAMUR - Os dentes são sempre duros.


(Mitaro segura a língua de Lis e a estica com os dedos)

MITARO - Olhe como a íngua dela é bonita! Como é macia!
NAMUR - As línguas são sempre assim.
MITARO - Você sempre tem de dizer alguma coisa.

(Mitaro e Namur param de mexer na boca de Lis. Agora olham os joelhos com atenção)

MITARO - Que joelhos!
NAMUR - Como todos.

(Mitaro passa os dedos pelos joelhos de Lis)

MITARO - Olhe a covinha aqui.

(Namur toca a covinha enquanto Toso, com a orelha colada no peito de Lis, escuta atentamente)

TOSO - (Num tom frio) - Está morta.
MITARO - Lá vem você com as suas.
TOSO - (Friamente) - Está morta, porque não se ouve o coração.
MITARO – Vamos ver?
TOSO – Além do mais, não respira.

(Namur apoia sua orelha no peito de Lis)

NAMUR - Pois é verdade, não se ouve o coração.
MITARO - Então, ela está morta?
TOSO - Sem dúvida.
NAMUR - É preciso dizer isso a Fando.
MITARO - Claro.

(Namur e Mitaro vão até Fando. Ele trabalha energicamente para costurar o tambor rasgado)

NAMUR - (A Fando) - Você sabe, Lis está morta.
FANDO - (Aturdido) - Lis está morta?
NAMUR - Sim.

(Fando vai até Lis. A olha com respeito e se aproxima dela com uma grande tristeza. A abraça, incorporando-a. A cabeça de Lis, cai, inerte para trás. Fando não diz nada. Os três homens do guarda-chuva, de pé e sérios, tiram o chapéu. Fando recoloca a cabeça de Lis no chão com muito cuidado. Fando está a ponto de chorar. De repente, ele apoia sua fronte contra a barriga de Lis. Apesar de não se ouvir nada, é provável que ele chore. Black-Out.)

Fim do 4o Quadro
QUADRO V

(Em cena, os três homens do guarda-chuva)

MITARO – Ele a havia prometido que quando ela morresse ele iria vê-la no cemitério com uma flor e um cachorro.
NAMUR - Não, não é isso. O que aconteceu é que ela havia dito que queria se suicidar e ele disse que era o melhor que ela podia fazer. Depois aconteceu que entre os dois homens e ela mataram o homem dos bilhetes para poder pagar o aluguel do triciclo. E então eles foram comprar sanduiches de anchova e pagar o aluguel, mas vieram os guardas e, apesar de não terem feito com má intenção, os levaram.
MITARO - É, eu me lembro que um deles passava o tempo todo dormindo e que ele dizia que não queria pensar porque era muito cansativo, e que então o seu amigo lhe disse que seria melhor se ela pensasse em anedotas e que ele respondeu que não sabia... (Pensando) - Mas isso é uma outra história, a que estou falando é a história do homem que levava num carrinho a mulher paralítica para Tar. Eu me lembro que ele disse que ouvira dizer que era muito difícil chegar a Tar, mas que tentaria, pois mais tarde disse para ela que quando chegassem, ele ia compor muitas canções lindas, como aquela da pena e que ele tocaria tambor para ela, e então foi quando eles se abraçaram.
NAMUR - Não, foi aí que ela descobriu que ele levava as algemas no bolso para colocar nela. Ele disse que não era nada demais e guardou-as. Então ela se zangou e disse que...
MITARO - Não, não, você muda tudo, você esquece de tudo e tudo confunde. O que aconteceu foi que logo chegou um guarda ao que era muito difícil de entender e disse ao velho da flauta disse que não o entendia porque era tonto do cu, e ele se entediou muito. (Pausa). E foi logo depois quando entraram aqueles dois homens que um tocava harmônio e o outro a máquina de escrever.
NAMUR - Ah, sim, me lembro, eles estavam no cemitério de ônibus. E tinham uma vida muito triste porque eles não podiam trocar de instrumentos.
MITARO - Mas, claro, claro que podiam.
NAMUR - Mas isso foi mais tarde. Além do mais, depois chegou o homem inteligente e os fez ver tudo o que sabia e eles ficaram apatetados. (Retificando) – Mas antes aconteceu toda aquela discussão dos homens do guarda-chuva sobre se havia ou não que tomar precauções.
MITARO - Não, nada disso, o que aconteceu é que ela e ele começaram a brincar de pensar. Mas como ele não sabia ficar numa boa posição, ele pensava muito mal e quando ela ensinou a ele a postura que devia se colocar para pensar, ele só conseguiu pensar em morrer.
TOSO - O que aconteceu é que ele vivia com sua mãe e ela queria que ele saísse de sua casa e para isso lhe dava muito mal de comer: ervilhas com água e um ovo duro para jantar. Ele ficou doente dos gânglios e sua mãe continuou sem lhe dar boa comida. Por isso ficou tuberculoso. Mas, depois, todas as culpas caíram sobre ele, porque quando disse a seu irmão o que fazia sua mãe, seu irmão não só acreditou como também o considerou um filho mal-agradecido por dizer essas coisas de sua mãe. Então, ele lhe contou como sua mãe havia maltratado o seu pai que estava no cárcere, até torná-lo louco, apesar do diretor da penitenciária ter dito que não lhe escrevesse cartas assim. Depois, acabou que o filho não sabia realmente se sua mãe era ou não culpada de sua enfermidade e da loucura de seu pai. E isto começou a lhe atormentar, porque dizia que nada estava claro e que o que havia pensado até aquele momento não era tão certo como se pensava...

(Namur e Mitaro seguiram as palavras de Toso, manifestando claramente seu aborrecimento)

NAMUR - (Interrompendo-o) - E tudo isso o que tem a ver?
MITARO - Você se dá conta de como sempre nos perturba? (Toso se cala)
NAMUR - Não se pode com ele.
MITARO – Não devemos lhe dar atenção nunca mais, como se ele não existisse.
NAMUR - Onde é que estávamos?
MITARO - Eu estava dizendo que ele tinha prometido ir vê-la no cemitério com uma flor e um cachorro.
NAMUR - Não, era antes. O que eu contava é como a garota ficou muito triste quando viu que ele não sabia fazer o burrinho, nem mesmo com o rabo.
MITARO - Sim, isso mesmo, ficou triste. (Pensando) - Mas o que aconteceu foi que ela levantou as saias para atrair o homem dos bilhetes e então o homem se aproximou deles e o mataram.
NAMUR - Não, homem, não; o que aconteceu é que eles não sabiam nenhum método para classificar tudo e que, de mais a mais, estavam preocupados porque ela tinha dito que se ele achasse o plano ruim ela diria, sem se importar com nada. E foi então que ele achou que o melhor era avaliar tudo.

(Entra Fando com uma flor e um cachorro amarrado numa corda de esparto. Os homens do guarda-chuva se calam e o seguem com os olhos, enquanto ele atravessa a cena sem nada dizer, sem parar e lentamente. Talvez ele esteja cansado, é o que parece.)

NAMUR - Vamos acompanhá-lo.
MITARO - Sim.
TOSO - E quando é que vamos para Tar?
NAMUR – Primeiro que acompanhá-lo. Depois nós vamos nos pôr a caminho, os quatro.
MITARO - É, todos juntos.

(Os três homens sob o guarda-chuva começam a andar atrás de Fando. No meio do palco, eles param e tiram os chapéus. Imediatamente continuam andando. Saem. Black-Out.)

Fim do 5o e último Quadro

Cai o pano.

domingo, 29 de abril de 2007

Resposta de Arrabal

Enviado por: Rê Meireles

Após publicar o post anterior, enviei um email a Fernando Arrabal para que ele fizesse uma visita ao nosso blog. O amável dramaturgo enviou um maravilhoso e-mail em resposta e ainda cedeu mais material, o qual publico a seguir.

Ha caído en mi escudilla el florilegio adjunto que me parece aun más parcial que la marsellesa’… Día de mucho, víspera de nada:

Arrabal. Gala de los Premios Max, abril de 2007

La X edición de los Max de las artes escénicas españolas fue una fiesta que contó, más allá de los premiados, con un disfrazado Fernando Arrabal, Premio de Honor. (Foto: Iñaki Andrés)


El autor teatra Fernando Arrabal recibió de manos de la ministra de Cultura, Carmen Calvo, el Premio de Honor. Durante su discurso, entre otras cosas, bromeó con los colores 'republicanos' del vestido de la ministra. Chema Moya.

Apareció el Rey, Arrabal, salvando la gala. Anárquico y divertido, como siempre. Otra clase magistral de civismo y sabiduría.

Jordi Soler Font

El Punt
Le largaron una ranchera a Arrabal (eche de menos a un Jorge Negrete o a un Pedro Infante, dada la categoria del recien llegado) cuando bajaba de una escalera de avion sin avion. Le disfrazaron de rey mitad Plantagenet mitad Tudor. Agradeció en euskera la labor de la señora de los lavabos, de la taquillera y demas miembros del elenco que esta beyond the courtain, cis. Dió las gracias, devenido demiurgo, a su mano derecha. Dijo que hablaba muchas lenguas; no me extraña. Le habian concedido menos de un minuto... a él, por quien se rindieron oyentes, radioyentes y televidentes (eran casi las dos de la madrugada). Arrabal se despojó de la estola de armiño y me parecio ver un traje magnificante. Su voz es telurica, mezcla de trueno y barreno. Que bien que me lo pase. Guau.
Arrabal fué reificado. Deificado ya lo estaba. Nadie ha puesto en duda, antes al contrario, la genialidad arrabaliana. ¡Salve, divinidad!
*La entrega a Fernando Arrabal del premio Max de honor.Blog del poeta Raul Herrero 17/04/2007
¡Cómo disfrutamos, cómo nos vestimos de gala sin necesidad de engalanarnos, cómo jaleamos y nos besamos en el besamanos de una fiesta que duró más de dos horas! En la X edición (como la cruz de San Andrés) de los premios Max las autoridades, es decir, la SGAE, otorgó el premio de honor a Fernando Arrabal. Y allí nos presentamos armados con libros, jaculatorias y arrabalescos para acompañar al homenajeado: Rivela, el andador y viajante, Martín Marcos, el trapecista del verso en soneto y sin sordina, el pintor de cigarros y cornucopias y quien esto escribe. Al final del acto se unieron a nosotros, entre mil otros, Ignacio e Iñaki dos estudiantes de meditación y astrofísica que desde San Sebastián se desplazaron hasta Bilbao para el acto. El escenario del palacio Euskalduna de Bilbao fue invadido por un grupo de mariachis. Una escalerilla de avión se deslizó portando a unas bailarinas que simulaban ser turistas aéreas (por el avión y las acrobacias que perpetraban). Los mariachis entonaban la ranchera: « Con dinero y sin dinero / hago siempre lo que quiero / y mi palabra es la ley… ». Tras unos instantes en la cima de la escalerilla surgió Arrabal. El escritor lucía una corona y una manta de armiño (toda la tramoya fue idea de los creadores de la gala). Tras realizar un “arrabalesco” descendimiento se dirigió a la Ministra de Cultura Carmen Calvo que lucía, hermosa y luminosa, un vestido con los colores violeta, amarillo y rojo.: “La veo muy republicana”. El público estalló en una ovación. Cada una de las ocurrencias de Arrabal fueron celebradas con entusiasmo. “Quiero agradecer mi premio a la señora que me ha atendido en los lavabos, a las azafatas, los acomodadores, el cajero que corta la entrada… y a mi mano derecha”, semejante afirmación, tras una hora larga de escuchar a los premiados las glosas de su parentela y amigos, cayeron como un manantial de agua pura, o como un puchero de agua hirviendo. En todo caso, las agudezas fueron vitoreadas. Fernando Arrabal lucía una casaca que le llegó desde Pekín, con una espiral de Ubú en la panza, regalo del Colegio de ‘Patafísica de China. Para la ocasión quien esto escribe lucía una camiseta realizada por Ester Fernández (Antonio Fernández Molina Factory) donde se leía: ¡Viva Arrabal!, para despejar dudas si las hubiese. Un señor de una altura del todo inapropiada se arrodilló ante Arrabal mientras le manifestaba su fervor. Varias señoras revoloteaban con la esperanza de cruzar unas palabras con el dramaturgo. Y la noche aún continuó pánica y patafísica….
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De: "El Correo"

Fernando Arrabal levantó el Max de Honor y aportó la necesaria dosis de surrealismo: salió a escena coronado y con una estola de armiño, rodeado de mariachis, para recibir el premio de manos de la ministra de Cultura, Carmen Calvo, y Ana Diosdado, presidente de la SGAE. Excéntrico, sí, pero el fundador del Movimiento Pánico es el dramaturgo español vivo más representado en el mundo.
«Me parece que está muy republicana», le soltó a la ministra, que lucía un multicolor vestido. «Merezco este honor, soy famoso pero completamente desconocido», soltó Arrabal, que montó el número que se esperaba de él. «Todas las noches doy las gracias a mi mano derecha, que tantos placeres me da. Eskerrik asko, neska polita». Y se fue «con sus novias», Calvo y Diosdado

La ministra de Cultura, Carmen Calvo, baila con Fernando Arrabal, en presencia de los galardonados en la décima edición de los premios. Chema Moya

Arrabal triunfa en los premios Max 2007

Arrabal: rey, sátrapa, gran mandarín y pequeño 'maradona' El autor dedica el galardón de Honor a «la señora de los lavabos» en el discurso más 'patafísico' -cómo no- de la gala Quico ALSEDO

BILBAO.- La entrada al Palacio Euskalduna de Bilbao era el metro en hora punta, todo flequillos cardados y pasadores en las corbatas, cuando se divisó una figura regia entre la multitud. Regia, si bien pequeñita. Escoltado por un asistente, mirando en su derredor como un niño, con pinta de abuelo travieso -o también de niño adulto-, llegaba Fernando Arrabal ataviado como de príncipe chino, aunque él probablemente preferiría emperador. De Asiria, en concreto.
La situación era evidentemente patafísica, pero no sólo eso: también pánica.

Pero hubo show, vaya si lo hubo. Mediada la ceremonia, recibido por un coro de mariachis cantando y una coreografía a la altura de su extravagancia -entre Los ángeles de Charlie y Almodóvar-, entró Arrabal a escena subido a una escalera de avión, con corona y báculo. Lo que sigue, más o menos, fue su insólito, genial parlamento, secundado por la ministra Carmen Calvo y por Ana Diosdado, presidenta de SGAE: «Bueno, le agradezco mucho a Sol Picó este disfraz de rey, yo diría aún más, ¡de rey del mundo! Porque nunca hubo un rey tan feliz como yo, con una corona que... Pero, ministra, diría que, con ese vestido, ¡la veo muy republicana!» -efectivamente Calvo, que se limitó a sonreír sin más, por si acaso, casi iba de bandera tricolor-.

Arrabal, que de nervios nada, comenzó a coger ritmo tras un muy teatral parón: «Sí, sí, merezco este honor porque creo que soy un poquitín famoso pero totalmente desconocido. Me para gente y me dice: 'Le admiramos muchísimo, ¡es usted un gran fabricante de relojes!'. Quienes me han dado este premio, estas damas republicanas [Diosdado ya incluida en el saco], le han echado coraje. En la TV francesa ya saben que soy incontrolable, eso lo sabe hasta el alcalde de... de... de Bilbao», dijo, al borde del imperdonable olvido.

Y siguió, imperial: «¡Dedico este premio a la señora de los lavabos! ¡Y a la taquillera! ¡Y a las azafatas! Y también a mi mano derecha, a la que todas las noches digo eskerrik asko, mírenla, mírenla... Y cuando me voy a dormir y ella me ha dado placer y dolor... Bueno, creo que he sobrepasado mis 55 segundos [llevaba ya cinco minutos]...», terminó, y soltó una risotada de niño malo-malo.

Pero no quedó ahí la cosa. Después de despedirse levantando el trofeo a lo Maradona con la Copa del Mundo (lo que convirtió a Carmen Calvo y Ana Diosdado en Valdano y Burruchaga), Arrabal coronó semejante derroche de imaginación minutos después ante la prensa con una antológica colección de frases. Explicó que su atuendo proviene «del Colegio Patafísico de Pekín, que acaba de participar en París en el Congreso Mundial del Pelo», admitió que «mi teatro es bestial y catacúmbico y está cambiando el mundo», habló también de su adorado Echegaray -«Le tengo tanta devoción, que sólo me falta leerle»-, y animó a todos los presentes a coger «un patinete o un helicóptero» e «ir al teatro microscópico que están haciendo Manu en Madrid o Antonio El Peruano en Murcia». Dicho lo cual, Arrabal bendijo a sus súbditos y los abandonó a su suerte.

¿Smoking o traje? ¿Pajarita o corbata? ¡Eso es para los aburridos! Cuando uno es Fernando Arrabal, va a los actos de homenaje vestido de gran mandarín y con capa y corona de monarca medieval, que, un día es un día. ¿Y si la ministra de Cultura trae un traje medio republicano? Pues se la corteja como un caballero. Faltaría más.

Fernando Arrabal apareció disfrazado de rey Diariode Navarra. El escritor y dramaturgo, Fernando Arrabal recibió el Premio de Honor; En su turno de agradecimiento del premio hizo mención a los colores del traje de la ministra de Cultura, Carmen Calvo, (morado, rojo, amarillo y gris) para espetarle "parece usted republicana", tras lo cual afirmó rotundo, por tres veces que se merece el premio otorgado. Se preguntó también "cómo me han dado el premio a mí que soy incontrolable, como bien sabe hasta mi amigo el alcalde de Bilbao", tras lo cual agradeció su premio "a la señora de los lavabos, las azafatas, las taquilleras y a mi mano derecha".

De: "El Comercio"

Unos mariachis que recibieron a Fernando Arrabal, premio de honor de los Max en esta edición y protagonista de la nota de color de la noche, no sólo por el disfraz de rey con el que apareció en el escenario, sino por sus ocurrencias, como la de decir a la ministra que estaba muy republicana (en referencia a su extraño vestido de grandes franjas de color rojo, amarillo y morado)

Arrabal, en su turno de agradecimiento del premio t afirmó rotundo, por tres veces que se merece el premio otorgado. Se preguntó también "cómo me han dado el premio a mí que soy incontrolable, como bien sabe hasta mi amigo el alcalde de Bilbao", tras lo cual agradeció su premio "a la señora de los lavabos, las azafatas, las taquilleras y a mi mano derecha".

De: "El Diario Vasco"

ANÁLISIS

¡Viva el rey Arrabal!

ROBERTO HERRERO


Menos mal que nos queda Arrabal, muy merecido Premio de Honor, que disfrazado de Rey le sacó los colores a «la ministro» y derrochó teatralidad. Alegría y genio.

El Palacio Euskalduna se vistió ayer de gala para acoger los X Premios Max de las Artes Escénicas organizados por la Fundación Autor y la SGAE. El triunfador de la noche fue Arrabal.

Fue Arrabal quien puso el toque de humor con su inolvidable intervención. Con música de mariachis aparecía en el escenario subido en una escalera y disfrazado de Rey. La ministra de cultura española, Carmen Calvo y la presidenta de la SGAE Ana Dios dado fueron las encargadas de darle el premio honorífico. «Mi traje de Rey es maravilloso. Parece usted republicana», dijo Arrabal dirigiéndose a la ministra española. «¿Cómo me han dado ustedes este premio si soy incontrolable? Eso lo sabe mi amigo el alcalde de Bilbao. Agradezco a mi mano derecha a la que me dirijo todas las noches y le digo: ‘‘Eskerrik asko, neska polita’’», concluyó en euskera en su genial estilo.

El gran protagonista de la velada, que se desarrolló en el palacio Euskalduna de Bilbao fue el dramaturgo Fernando Arrabal, que con sus conocidas dotes para provocar desde la extravagancia y salirse de lo establecido brindó los mejores momentos de una gala que estuvo dedicada al mundo de la danza.

Arrabal compareció tocado con capa y corona a los sones de un mariachi y la canción El rey para recibir el galardón de honor de manos de Ana Diosdado y la ministra Carmen Calvo. «esta usted hoy muy republicana, ministra», le espetó en alusión a los colores de su vestido que recordaba la bandera tricolor republicana. Y dedicó el premio a las azafatas, las taquilleras y a su mano derecha. «El teatro es mucho dolor pero yo soy un tío jatorra que tiene un par de arraultzas».


------------------------------------------------------------------------------------------------- ¡ Qué gusto dio ver a Arrabal en los Max de teatro. Puso un punto de ironía e inteligencia. ¡¡¡ Solo Arrabal, dando las gracias a la mujer de la limpieza y de los baños, a las azafatas y a todos los desconocidos que con justicia se merecían más ser nombrados que la mayoría de los que anunciaban en el escenario. Me gustó mucho cuando, coronado rey del mundo, hizo ver a la ministra de cultura que estaba a su lado, y de soslayo, su vestido republicano, pillandola y que a punto estuvo de confesa y darle la razón. Una vez más, siempre, el genial y admirado Arrabal, es el animal más bello e indómito de cuantos pisan


la tierra. Libre en su matemática disciplina, coro y puro Acto del teatro. Disfruté mucho la verdad, y menos mal que nunca defrauda y mereció la pena aguantar ; Arrabal… PORQUE SIGUE SIENDO EL REY.

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El genial autor teatral Fernando Arrabal (i) recibió de manos de la ministra de Cultura, Carmen Calvo, el Premio de Honor de la X edición de los premios Max de las artes escénicas españolas que distinguen los mejores trabajos, autores o intérpretes de 2006 en esta faceta artística, en el Palacio Euskalduna de Bilbao.

EUROPA PRESS

Premio Max de Honor, al dramaturgo Fernando Arrabal que protagonizó el momento más hilarante de la velada, ya que formó parte de una coreografía por la que accedió al escenario vestido de rey, con corona y manto de armiño, a los sones de la ranchera 'El rey' que cantaban unos mariachis del grupo 'Méjico Lindo' en directo.

"Sí, sí... merezco este premio. Porque creo que soy un poquito famoso pero un completo desconocido", dijo antes de bromear acerca del vestido "con la bandera republicana" que llevaba la ministra de Cultura, Carmen Calvo, encargada de entregarle el 'max'.

El autor teatra Fernando Arrabal recibió de manos de la ministra de Cultura, Carmen Calvo, el Premio de Honor de la X edición de los premios Max. (Chema Moya ).

La sorpresa de la noche

El escritor y dramaturgo, Fernando Arrabal, recibió el Premio de Honor;

Arrabal, en su turno de agradecimiento del premio, hizo mención a los colores del traje de la ministra de Cultura, Carmen Calvo, (morado, rojo, amarillo y gris) para espetarle "parece usted republicana), tras lo cual afirmó rotundo, por tres veces que se merece el premio otorgado.

De: "Heraldo.es"

«Me siento aquí el rey de todo el mundo», gritó anoche Fernando Arrabal. Ayer los focos miraron a Bilbao. El Palacio Euskalduna acogió la X edición de los Premios Max del teatro español. El autor teatral Fernando Arrabal recibió el Premio de Honor.

Y, ¡ay si no fuera por los atrevidos! Fue una gala típica pero muy mejorada por la osadía de ciertos premiados. Como la de Arrabal. «Señora ministra, la veo yo muy republicana», vaciló en el escenario. Carmen Calvo llevaba un vestido con los tres colores de la bandera republicana y el artista no pudo contenerse. Y siguió: «Sí, sí, sí... ¡Me merezco este premio!».

ARRABAL, momento más gozosamente teatral de la noche

Fernando Arrabal levantó el Max de Honor y aportó la dosis de surrealismo: salió a escena coronado y con una estola de armiño, rodeado de mariachis, para recibir el premio de manos de la ministra de Cultura, Carmen Calvo, y de Ana Diosdado, presidenta de la SGAE. Excéntrico, sí, pero el fundador del Movimiento Pánico es el dramaturgo español vivo más representado en el mundo.

«Me parece que está muy republicana», le soltó a la ministra, que lucía un multicolor vestido. «Merezco este honor, soy famoso pero completamente desconocido», soltó Arrabal, que montó el número que se esperaba de él. «Todas las noches doy las gracias a mi mano derecha, que tantos placeres me da». Y se fue «con sus novias», Calvo y Diosdado.